Lançado de surpresa na noite do Superbowl – numa estratégia até então inédita da Netflix –, Cloverfield Paradox é o terceiro capítulo da antologia Cloverfield. Enquanto o primeiro era um típico filme de monstros, que se utilizou do found footage como forma de inovar a sua narrativa, o segundo, Rua Cloverfield, 10, foi um thriller claustrofóbico centrado passado quase que inteiramente em um abrigo antibombas. Este terceiro se assemelha ao anterior na sua ambientação, trocando o abrigo por uma estação espacial, mas apresenta um tom diferente dos demais.

Escrito por Oren Uziel (Shimmer Lake), o roteiro acompanha Hamilton (Gugu Mbatha-Raw) – a única personagem que ganha algum tipo de desenvolvimento dramático e uma história prévia –, uma cientista que precisa lidar com o trauma da perda recente dos filhos ao mesmo tempo em que a Terra sofre com o fim iminente das suas fontes de energia – o que inicia conflitos internacionais e a possibilidade de uma guerra. Convencida pelo marido Michael (Roger Davies), ela decide fazer parte da equipe de cientistas e astronautas que, a bordo de uma estação espacial, realizará um experimento com o intuito de gerar energia suficiente para alimentar todo o planeta. O experimento, porém, dá errado, e a equipe passa a presenciar estranhos acontecimentos, ao passo que a população da Terra sofre as consequências dessa falha.

As referências do texto de Uziel são claras e nem um pouco originais. De Alien: O 8º Passageiro ele tirou a cena em que o peito de John Hurt explode com o nascimento do alienígena. De filmes como 2010: O Ano Em Que Faremos Contato veio o conceito de tratar os astronautas como um microcosmo da nossa sociedade, refletindo lá em cima os conflitos que acontecem aqui embaixo (ainda que isso não seja muito bem desenvolvido), e de Projeto Filadélfia surgiu a ideia da mulher fundida à fiação da estação. Embora estas alusões não sejam consideradas um equívoco – JJ Abrams, produtor do longa, construiu a sua carreira em cima da nostalgia –, é inegável que o roteirista tropeça em alguns aspectos básicos da narrativa.

Afinal, é bastante conveniente que alguém nos explique o problema do paradoxo poucos segundos antes de o tal paradoxo acontecer, o que se mostra uma estratégia preguiçosa do roteirista para passar uma informação importante. Além disso, existem diversas incongruências grosseiras, como quando é dito que é preciso de três pessoas para desacoplar uma parte da estação espacial, mas quando eles chegam lá, duas pessoas ficam observando a terceira fazer todo o trabalho sozinha (e, aliás, só eu que cansei dessa justificativa de que é necessário ir até uma zona de risco para desativar, ou ativar, algo manualmente?). Isso sem falar que é incrível a capacidade da estação em continuar funcionando após tantas explosões, perdas de energia e com peças faltando.

Mas apesar de reconhecer cada um dos desses problemas, não achei que eles prejudicaram tanto a experiência. As incongruências atrapalham, sim, mas ainda pude me entreter pela forma como o longa abraça o absurdo daquela situação, sem sentir a necessidade de explicá-la em detalhes. E, nesse quesito, Oren Uziel se sai muito bem criando situações simplesmente absurdas envolvendo um braço com vida própria e personagens que surgem dentro das paredes, além do fato de que o experimento dos cientistas causou o desaparecimento da Terra (isso mesmo!). É tudo tão bizarro que achei impossível levar aquilo à sério.

Com isso, o diretor Julius Onah imprime a sua própria marca ao investir em um tom que se equilibra as cenas de maior tensão com toques de humor (além de um pouco de humor involuntário). A mistura pode não agradar a todos, mas eu me diverti. E ainda que aposte em diversos clichês, Onah é hábil ao manter o ritmo da narrativa em meio a tantas viradas na história. É só ao final que percebemos o quanto a subtrama de Michael é descartável, por exemplo. Mas até chegar lá, o filme já nos envolveu na sua atmosfera claustrofóbica e intrigante. Cloverfield Paradox não é tão bom quanto os anteriores, mas essa ideia de fazer uma antologia com tons diferentes a cada capítulo me agradou bastante e fiquei curioso com o que virá depois. Paradoxalmente, porém, isso também mostra o quanto está é uma obra esquecível.

Cloverfield Paradox (The Cloverfield Paradox)
EUA, 2018 – 102 min.
Direção: Julius Onah. | Roteiro: Oren Uziel.
Elenco: Gugu Mbatha-Raw, David Oyelowo, Daniel Brühl, John Ortiz, Chris O’Dowd, Ziyi Zhang.