A Sessão da Meia-Noite do Festival de Sundance 2020 apresentou uma surpresa: Impetigore, filme de terror da Indonésia. Em cinco anos de cobertura, ainda não tinha visto nenhuma obra de terror de língua não inglesa no Festival. Neste caso, um longa muito melhor do que alguns selecionados dos Estados Unidos e do Reino Unido.

Em Impetigore, a jovem Maya descobre, após ser atacada por um homem, ter direito à herança de uma mansão em uma aldeia distante, no interior da Indonésia. Em função da difícil vida que levam em Jacarta, Maya e sua melhor amiga resolvem viajar à aldeia para revindicar a herança. Ao chegarem ao local, percebem coisas estranhas: não há crianças na aldeia, e os moradores pareciam estar esperando por ela, com uma surpresa nada agradável.

Primeiramente, é necessário superar a barreira cultural, porque a obra reflete o modo de pensar indonésio, muito diferente do ocidental. Para o espectador menos aventureiro, o senso de humor, especialmente no primeiro ato, parece uma pouco deslocado. Em certa medida, Impetigore lembra o fabuloso The Wailing, filme coreano de 2016. Não me entenda mal, porque não estou comparando a qualidade dos dois filmes – The Wailing é uma obra prima. Faço essa comparação apenas para que se possa formar a expectativa correta sobre a obra indonésia.

No filme, temos maldições, pactos com o capiroto, assassinatos, fantasmas, shamãs, rituais religiosos e um grande choque cultural entre as mentalidades do mundo urbano e rural. Cada um desses recursos narrativos é usado com relativo grau de eficiência, com destaque para as cenas de violência, algumas delas cruas e brutais, outras muito criativas, ao fazerem uso inteligente de luz e sombras integrados ao tema das marionetes.

Se o filme começa trôpego, também é verdade que engrena a partir da chegada da protagonista na aldeia isolada, no meio da floresta. O cenário é muito diferente daquilo que estamos acostumados e parece estar parado no tempo (mais uma semelhança com The Wailing) e é muito bem explorado pela excelente cinematografia. As atuações, apesar de terem um tom um pouco diverso daquilo que estamos acostumados, têm bom nível, especialmente nos papéis de Maya, Ki Saptidi e sua mãe.

Impetigore tem suas limitações, mas, no geral, é um filme de terror psicológico e sobrenatural eficiente. Quando investe nos jump scares, o filme enfraquece, porque são sempre óbvios, entretanto, quando investe na violência e no terror psicológico, funciona em alto nível, causando reações fortes na plateia. Em alguns momentos, o baixo orçamento se faz notar, essencialmente quando a cena demanda CGI. Por outro lado, os efeitos práticos funcionam, com algumas cenas muito assustadoras.

Um filme que merece ser visto, principalmente se você é fã de terror e gosta de obras diferentes, que tragam desafios interpretativos e nos façam ter contato com culturas diferentes, bem como com suas ideias sobre religião, espiritualidade, bem e mal. Um prato cheio para os fãs deste site.

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