Contatos de 4º Grau No intuito de preservar a expectativa e a inocência daqueles que assistiram ao trailer e/ou gostam de embarcar nas “mitologias marketeiras” criadas para dar hypes em torno de filmes documentais, foi que tornei invisível o quinto parágrafo desta crítica. Se você é fã deste tipo de gênero, ignore-o. Se quiser ler por sua conta e risco, basta grifá-lo com o mouse. Mas depois não diga que não avisei.

Baseado em imagens de arquivo das entrevistas que a psiquiatra Abigail Tyler deu a Universidade Chapman no ano 2000, Contatos de 4º Grau conta o horror que esta mulher passou ao tentar explicar e provar que foi abduzida por alienígenas (o quarto grau que dá título a fita), assim como diversas pessoas da cidade de Nome, no Alaska.

Logo no início, Milla Jovovich se apresenta para a câmera dizendo que interpretará a Dra. Abigail na reencenação do caso. Ao mesmo tempo, o diretor da obra, o nigeriano Olatunde Osunsanmi, surge nas “fitas de arquivo” entrevistando a médica. A mulher é pele, osso e olhos esbugalhados que lembram um mangá japonês. Ao decorrer do longa, o espectador vai entendendo a degradação da personagem após a morte trágica do marido, que afetou profundamente não apenas a ela, mas também a toda sua família.

Em suas sessões de hipnoterapia, Abigail descobre que diversas pessoas que sofriam de insônia, sonhavam com a mesma coisa: a aparição de uma enorme coruja. Alguns homicídios e suicídios depois, concluiu que todas haviam sido abduzidas por extra-terrestres – e Abigail termina, ela própria, hipnotizada por um colega de ofício, descobrindo que também teve contato com os alienígenas.

Muito bem conduzido, Contatos de 4º Grau não passa de um mockumentary (documentário falso). Não acredite que é baseado em fatos. Tudo que existe sobre o assunto foi criado e plantado na imprensa pela máquina de marketing do filme. Basta digitar o nome da tal “Dra. Abigail Tyler” no Google que você vai descobrir que nunca houve uma médica com este nome clinicando no Alaska. Sites que “comprovavam” a existência da doutora, como o Alaska Psychiatry Journal ou o Alaska News Archive, ambos fora do ar, tiveram os seus domínios registrados em outubro de 2009 – enquanto a história data de 2000. A própria Chapman University, onde Osunsanmi teria entrevistado Abigail, se espanta com a quantidade de pessoas que acreditam na trama. O diretor usa o logotipo e o nome da universidade porque pediu autorização. Ele se formara lá em 2000, em Belas Artes, com especialização em audiovisual.

A grande jogada do longa é sua narrativa inteligente ao reconstituir as cenas, intercalando as “reais” com as encenadas, ora em tela dupla ou múltiplas. As “65 horas de arquivos da Dra. Tyler” (a atriz não é creditada, evidentemente) são essenciais para criar o clima de pavor do filme. Osunsanmi apela para os sentidos no intuito de provocar uma atmosfera angustiante e perturbadora: são muitos os planos-detalhes em objetos, como as câmeras VHS que registram as sessões de hipnose e o gravador de áudio usado como diário.

Desaprovado pelas autoridades locais do Alaska, que consideram o longa extremamente desrespeitoso com as pessoas reais de Nome que tiveram familiares sumidos, este herdeiro direto de A Bruxa de Blair promete mais do que cumpre, mas ainda assim é uma ótima diversão para quem curte o polêmico tema.

Contatos de 4º Grau (The Fourth Kind)
Estados Unidos, 2009 – 98 min.
Direção e Roteiro: Olatunde Osunsanmi.
Elenco: Milla Jovovich, Will Patton, Elias Koteas, Hakeem Kae-Kazim, Corey Johnson.